Arquitetura Comercial e suas dinâmicas no Novo Normal



 

por Rogério Gaspar

 

Há algum tempo, “gurus de plantão” da área de varejo, exercitando os possíveis cenários frente a aceleração do e-commerce, chegaram a ousadia de decretar a morte da loja física. Recentemente tiveram que fazer o “mea máxima culpa” diante da conversão de lojas digitais em lojas físicas pelo mundo afora. Sem dúvida não será o apocalipse.

Quando voltamos no tempo e analisamos a movimentação das atividades econômicas relacionadas com o espaço físico, percebemos que o encontro de fluxos de indivíduos deram origem ao mercado como local de troca, cujo papel importante, não era apenas a atividade econômica, mas, principalmente, a vida social, segundo Heliana C. Vargas.

Mesmo com as mudanças de comportamento pressupostos nas gerações rotuladas, o consumo nunca foi contextualizado pela atividade do comprar, mas pelo dinamismo social, pois sem o encontro, não há a troca. O nosso cérebro primitivo, anseia por ver, tocar, sentir, ouvir, experimentar, daí a necessidade de uma visão mais ampla em transformar os espaços comerciais, de pontos de venda ou pontos de compra em espaços de experienciação.

A tecnologia transformou-se em uma ferramenta poderosa na modernização do varejo. A internet mudou a vida do varejo, talvez uma das mais impactantes mudanças das últimas décadas. Milhares de produtos disponíveis para compra a um clique de distância. Uma jornada de compra que preza pela simplicidade e pelo mínimo de tempo despendido, mas fria sem pessoalidade. Com a aceleração da tecnologia, a velocidade da informação foi exponencializada, verdadeiros tsunamis de informação em meio ao faroeste digital. Lojas ao redor do globo transformaram-se em verdadeiros playgrounds digitais, e a carga massiva gerou momentos de micro tédios no consumidor e a percepção do quanto mais High Tech somos, maior a necessidade de estarmos High Touch.

No momento em que estudos da antropologia do consumo detectam a necessidade urgente da humanização dos espaços comerciais e do resgate de valores abandonados no passado, bruscamente o mundo desacelera numa verdadeira guerra contra a pandemia, que paralisa a economia mundial com as portas do varejo encerradas como em dias de luto.

Após ciclos de sobe e desce como uma montanha russa, exatamente no ápice de sua reinvenção, o varejo é pego de calças curtas e agora tem a obrigatoriedade de re-reinventar-se. Como ser high touch, se o afastamento social deixar hábitos de que o “tocar” é perigoso ou “pecaminoso”. Um novo cenário se descortina pós-pandemia, o mundo não será mais o mesmo, ou será?

Neste momento de disrupção, temos que reavaliar as estratégias, estabelecer uma conexão com os stakeholders, fortalecer os valores das marcas. Enquanto o mundo se empenha na descoberta da vacina, varejistas e retail designers ingerem pílulas de sabedoria em busca de conhecimentos para perguntas que não se calam. Como a cultura das empresas estão sendo impactadas pelo “novo normal”? Como serão os cenários pós-covid? Como atender as expectativas das marcas, dos consumidores e dos colaboradores? Como preparar o novo ambiente?

Muito se discutiu e o trivial já sabemos. Inicialmente a jornada do cliente deverá ser segura e sem contato físico. Devemos redesenhar os fluxos, layouts, buscar simplicidade no trajeto, criar novas trilhas, não fazer o consumidor andar por toda a loja, ele irá reaprender a circular. Revisar o planograma da loja, check-out rápido para evitar aglomeração ou até mesmo a eliminação dos caixas e outros atritos, mudar a forma de pagamento. Visual Merchandising diferenciado passa a ser mais valorizado. A Assepsia tem que ser ágil e percebida pelo usuário. A marca deverá enxugar os excessos, prezar pela simplicidade, o novo cliente implora por simplicidade. A marca obrigatoriamente deverá expor o propósito, mostrar suas essências, sua identidade, entender as necessidades do cliente e levar o conforto até ele, expressar a preocupação com a qualidade de vida, um olhar voltado para a base da pirâmide.

Implantar novas tecnologias para atender o novo comportamento, vitrines com QR-Code, vendas on-line, lockers para retiradas de produtos, integrar o digital com físico para gerar mais possibilidades de contato com o cliente e promover ação de cauda longa, revisão do cartazeamento para comunicação direta com o consumidor e conter mensagens subliminares, informar mix no ponto físico. Discutir atendimento ficou no passado, o vendedor do piso de loja não vende mais, ele tem que ser um facilitador de experiência de consumo pois o varejo está evoluindo para o auto serviço e o auto serviço assistido, daí a importância do environmental graphic.

Devemos desencadear um novo ciclo positivo. Transformar as lojas de “provar produtos” para lojas de “experiências da comunidade”, espaços que não sejam só para vender, pois já compramos on-line de várias maneiras, a loja como lugar de bem estar, de convivência, varejo com perfil acolhedor. Considerar o arquétipo da marca como um de seus principais ativos. Qual estilo de vida vamos atender, qual sua persona, sua tribo?

As marcas devem criar laços fortes com o cliente e aplicar o storytelling, é uma ótima maneira de fazer conexões, de educar, de divertir e se envolver, ajuda a criar memórias. Histórias apelam para a emoção do consumidor, tocam seu coração e sua mente e humanizam a marca. Torne seus clientes parte de sua história. Nós somos animais sociais, queremos participar. As pessoas querem pertencer a algo, deixe-as pertencer à sua marca, deixe-as participar com você.

Temos que entender as necessidades do consumidor e diminuir suas dúvidas. Os Retail Designers deverão interpretar demandas do cliente do cliente de forma mais incisiva. Usar informações das agências especializadas, pois não sabemos como serão suas atitudes, se os consumidores gastarão mais com moda, mas sabemos que terão a necessidade de consumo.

O consumo será ressignificado. As pessoas pensarão em ter menos produtos, mas de qualidade melhor e a moda pode perder mais que os outros setores. Teremos um maior foco na sustentabilidade, uma nova onda da reciclagem, novos hábitos de reutilização das coisas. As lojas terão seus produtos mais expostos, serão mais um showroom. Não queremos tocar, queremos comprar e que seja entregue em nossa casa. As pessoas querem viver a experiência na loja.

Ao contrário do que se pregou, a loja física tem vida sim, motivada pelo consumo hedônico caracterizado como exercício de prazer e motivações recreativas que tem a finalidade de diversão agregada ao consumo onde a tecnologia tem desempenhado um importante papel. O jogo de xadrez está na motivação pelas compras obrigatórias, as chamadas compras para a sobrevivência. Cerca de 80% do que compramos no mês são quase sempre as mesmas coisas e que tendencialmente isso pode migrar para a compra on-line, e os outros 20% das compras, temos que ir até a loja. O foco deve ser voltado para a magia da transformação destes espaços, que devem ser áreas de experiência, despertar gatilhos mentais para que este local de consumo seja uma experiência sensorial da marca, sem atrito, sem bordas, sem limite, tem que ser fluida.

As lojas não são mais lugares apenas para o ato de compra. Não é mais sobre vender, é sobre socializar, lojas são “Hubs Sociais, então vamos projetar hubs sociais, valorizar novos produtos e tecnologias, projetar playgrounds sensoriais, promover o social retail, os chamados “third place”, lugares que nos distraímos e convivemos , que propõe a experiência da marca a partir da empatia.

O profissional de arquitetura e design tem um papel ainda mais preponderante, pois é dele a responsabilidade por humanizar os espaços em todos os setores da sociedade. Certamente o profissional com conhecimentos de neurociência aplicada a arquitetura, chamada de “neuroarquitetura”, de caráter inter e multicisplinar, tem um olhar aprimorado como importante ferramenta de contribuição para elaboração de espaços comerciais e ambientes que promovam a experiência positiva ao usuário, ancorados na arquitetura e no design como fatores de estímulos comportamentais para criar memórias afetivas positivas.

Como pesquisador de comportamento de consumo, venho trabalhando o Método Neuroconsumer no qual utiliza os conhecimentos articulados no triuno NEUROARQUITETURA | NEUROMARKETING | DESIGN EXPERIENCIAL, como ferramenta de melhoria da experiência do varejo, que vem sendo desenvolvida baseada na minha experiência de 32 anos em Retail Design, uma forma de contribuir com a apaixonante área da Arquitetura Comercial.

O velho varejo não existe mais, para atender as novas demandas que tangem a arquitetura comercial, temos que apertar a tecla “Restart Retail” e reiniciar o varejo. Você está preparado?

Restart Retail: Arquitetura Comercial e suas dinâmicas no Novo Normal, título desta coluna, é homônimo do livro de minha autoria que será lançado em breve. Conta com a honrosa participação do Arquiteto e Especialista em Neurociências e Comportamento Humano, Lorí Crízel, idealizador do selo NeuroArch, assim como de meus caros pares docentes da pós-graduação do IPOG. Tráz ainda a contribuição de renomados arquitetos da Arquitetura Comercial e experts do cenário nacional em iluminação, sustentabilidade, franquias, eficiência energética, varejo 4.0 e outras especialidades.


 

ROGERIO GASPAR
Arquiteto e Urbanista (1991) pela Universidade de Guarulhos/SP | Pós-graduado em Master em Arquitetura & Lighting pelo IPOG | Membro da Academy of Neuroscience for Architecture – ANFA | Certificado internacional em An Introduction to Consumer Neuroscience & Neuromarketing pela Copenhagen Business School – CBS | Certificado em Introduction to Neuroeconomics: How the Brain Makes Decisions pela National Research University Higher School of Economics – HSE | Certificado em Neurociências Aplicada a Ambientes e Criação pela FAAP | Pesquisador sobre Comportamento do Consumidor | Desenvolvedor do método Neuroconsumer com abordagem articulada no triuno Neuroarquitetura – Neuromarketing – Design Experiencial como ferramenta aplicada ao Retail Design| Certificação em Lighting Designer, Visual Merchandising e especialização em Cores, todas pelo Centro Universitário Belas Artes de São Paulo | Negociações de Sucesso: estratégias e habilidades essenciais pela University of Michigan | atualização em Sustentabilidade Aplicada aos Negócios pela Fundação Getúlio Vargas | Atuou como professor do Curso de Arquitetura na UnG – Universidade de Guarulhos/SP pelo período de 1992 à 1998 | Atualmente é professor convidado de cursos de Pós-graduação nas áreas de arquitetura e design do IPOG | Founder da FGASPAR Arquitetura especializada em design estratégico de varejo e consolidada no segmento de projetos e execução de obras rápidas. Há 32 anos no mercado de Retail Design, tem em seu portfólio mais de 520 projetos e obras executadas para importantes marcas brasileiras | Detentor do prêmio Design de Loja pela Alshop em 2016 | Diretor do CBC – Comitê Brasileiro de Cores | Gestor de Pesquisas do CECAL – Centro de Estudo de Cores para a América Latina | Membro do Comitê de Arquitetos e Designers da ForMóbile | Consultor e Palestrante | Membro do RDI – Retail Design Institute .




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