Ambientes Impactantes: o que a NeuroArquitetura tem a dizer sobre isso



Por Andréa de Paiva

 

O que é um ambiente impactante para você? Talvez sejam as igrejas góticas, com sua arquitetura imponente e cheia de história. Ou talvez seja uma residência luxuosa, com sua rica decoração. Ou então um estádio de futebol, com seu porte e valor sentimental. O fato é que diferentes características dos ambientes fazem com que alguns deles se destaquem em relação aos demais, ficando gravados na nossa memória e gerando impactos claramente detectáveis nas nossas sensações. Contudo, estudos na área da NeuroArquitetura têm revelado que os ambientes podem impactar diversas funções cerebrais, muitas delas fugindo da nossa percepção consciente.

 

Por que alguns espaços são tão marcantes e outros não?  Nossa memória de longo prazo apresenta maior facilidade para gravar informações de ambientes que nos geram maior impacto emocional do que de lugares mais neutros [1]. Por isso, para muitas pessoas basta uma visita à Notre Dame de Paris ou ao Maracanã no Rio de Janeiro ou até mesmo à Brasília para que a lembrança daquela experiência fique gravada na memória.

 

A mesma área cerebral responsável pelo processamento das memórias de longo prazo, também apresenta papel central no funcionamento do nosso “GPS cerebral”. Em outras palavras, ela está diretamente relacionada ao processo de orientação e navegação espacial [2]. E se até então falamos de ambientes impactantes que nos marcaram positivamente, não podemos deixar de ressaltar que experiências negativas também podem ter impacto emocional intenso e ficarem gravadas na nossa memória. Quem já se perdeu dirigindo no meio de um grande centro urbano, como a cidade de São Paulo, sabe quão desagradável e marcante a experiência pode ser. Determinadas características do ambiente, como a simetria 360o, a ausência de identidade visual, a falta de placas indicativas e de estímulos sensoriais diferenciados podem tornar a experiência de circular por uma cidade ou mesmo por um edifício algo bastante desorientador e estressante.

 

Até mesmo os espaços do nosso dia a dia, como nossa casa ou trabalho, podem nos impactar de diversas formas. A arquitetura corporativa, por exemplo, deve ser planejada de modo a oferecer espaços que auxiliem os colaboradores a adotarem os estados mentais adequados para as atividades que cada trabalho exige. Uma reunião de criação da equipe de marketing, um primeiro encontro com um cliente importante, a revisão de um relatório, cada uma dessas atividades requer um estado mental específico e um ambiente que seja adequado para uma delas não necessariamente será adequado para outras. Sendo assim, é importante ter em mente que o ambiente é uma das variáveis que influencia a nossa performance e, por isso, é importante nos certificarmos de que estamos criando espaços adequados à função a que se propõem.

 

É comum que a gente se preocupe com as sensações, emoções, estados mentais e comportamentos que os ambientes geram naqueles que os ocupam, mas a NeuroArquitetura nos ensina que não podemos parar por aí. Alguns ambientes, principalmente aqueles que são ocupados por mais tempo ou com bastante frequência, podem nos impactar de forma ainda mais profunda, resultando em alterações que persistem mesmo depois da desocupação daqueles espaços. Em outras palavras, ambientes de longa ocupação podem gerar em seus usuários efeitos de longo prazo, que demoram mais tempo para serem revertidos [3].

 

Estudos que datam desde a década de 1960 vêm apontando para como algumas características do ambiente podem influenciar na transformação do nosso cérebro no longo prazo. Isto é, o cérebro pode ser estimulado a ficar ainda mais eficiente, reforçando as conexões já existentes entre neurônios, criando novas conexões e até mesmo criando novos neurônios através do processo de neurogênese, que acontece em áreas específicas do cérebro, como o hipocampo. Por outro lado, a ausência dessas características pode ter efeito contrário, resultando na perda e no enfraquecimento de sinapses (conexões entre neurônios) [4].

 

A NeuroArquitetura traz grandes contribuições para que arquitetos e urbanistas possam aumentar seu entendimento sobre como seus projetos podem impactar os usuários de cada espaço. Todo ambiente é impactante. Mas nem todo impacto é positivo e, por isso, é importante nos cercarmos do máximo de conhecimento sobre como a arquitetura nos afeta. É comum também que haja conflito entre os impactos e que um mesmo ambiente que no curto prazo gere impactos positivos, no longo prazo pode ter efeito contrário. Por isso, é preciso entender quem são os principais grupos de usuários daquele lugar, seu tempo de ocupação e o tipo de atividade que eles realizarão em cada ambiente. É esse entendimento que servirá de apoio para a tomada de decisão e que permitirá a criação de espaços equilibrados, buscando a eficiência no curto prazo e a saúde e o bem-estar no longo prazo.

 

 

Referências:

 

[1] Damasio, A. (1994) Descartes’ Error. São Paulo: Companhia das Letras

 

[2] PAIVA, A. (2018) Navegação Espacial: NeuroArquitetura e o GPS cerebral. Disponível em neuroau.com

 

[3] PAIVA, A., JEDON, R. (2019) Short- and long-term effects of architecture on the brain: Toward theoretical formalization. Frontiers of Architectural Research

Volume 8, Issue 4, December 2019, Pages 564-571

 

[4] Rozenzweig, M., Bennett, E., Diamond, M. (1972) Brain Changes in Response to Experience. Scientific American 1972 February; 226(2): 22-29

 

 

 

 

 

Sobre Andréa de Paiva:

Consultora na Fundação Getulio Vargas. Cordenadora-adjunta e professora do curso de Neurobusiness da FGV-IDE. Criadora e professora do curso Neurociência Aplicada a Ambientes e Criação na FAAP. Master of Arts (MA) em Arquitetura pela Middlesex University em Londres e arquiteta pela USP. Certificada em Design Thinking pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT) de Boston. Autora do site neuroau.com Co-autora do livro Triuno: neurobusiness e qualidade de vida.

Face/Insta: @neuro_au

E-mail: [email protected]





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